
Idade: 59
Cidade de origem: São Francisco de Assis do Piauí, PI
Cidade que mora atualmente: São Paulo, SP
Ano da migração: 1985
Ocupação Atual: Dona de casa
Como era a vida onde você morava? Você morava na cidade ou no interior?
Era bastante difícil, porque não tinha um meio de ganhar dinheiro. Tive que trabalhar na roça até meus 18 anos, e era muito difícil. Comecei arrancando mato na roça com as mãos. Eu morava no interior, em uma casinha de taipa com minha mãe, meu pai e meus três irmãos. Eu me lembro que, pra gente ir tomar banho, a gente tinha que se enrolar num pano de saco, pois não tínhamos outra roupa para usar enquanto a que estávamos usando secava. Hoje está mais fácil, mas naquela época não tinha as coisas que tem hoje e, vivendo da roça, se desse, você comia; se não desse, você não comia. Lá não tinha mercados, tinha uma vendinha e você tinha que trocar o feijão ou uma galinha pelo açúcar, pelo óleo, por exemplo.
O que fez você decidir sair da sua terra?
Procura por melhores condições de vida. Não tinha oportunidade nenhuma, nem de estudar. Eu sempre pensei: eu não quero continuar aqui, eu quero estudar. Um dos principais motivos que me levaram a sair de lá também foi por conta do meu pai, que era alcoólatra e ficava muito violento quando bebia. Então, quando surgiu a chance de vir para São Paulo, não pensei duas vezes. Aos 15 anos, antes de vir para São Paulo, eu já tinha saído da cidade para morar em Petrolina, mas a situação também era um pouco difícil e eu ficava indo e voltando. Durante alguns anos, trabalhei em casa de família e, aos 18, decidi vir para São Paulo, para ganhar mais.
Foi uma decisão fácil ou difícil? Por quê?
Para mim, foi fácil. Sempre fui muito independente.
Como você se locomoveu da sua cidade até aqui?
De ônibus.
Tinha alguém aqui te esperando ou você veio por conta própria?
Um tio chamado Frausino já morava aqui e me chamou. Minha ideia era ficar na casa dele aos finais de semana, mas não deu certo.
O que você lembra do seu primeiro dia aqui?
Foi assustador. Todo mundo falava que acontecia um monte de coisa, assalto… Quando cheguei na rodoviária Tietê, estava sentadinha morrendo de medo, com um meio mundo de gente, e vi um homem chegando de chapéu. Logo pensei que era um assaltante, mas era meu tio.
O que você sentiu mais falta quando chegou?
Não.
O que te ajudou a se adaptar à nova cidade e seguir a vida?
Fui muito bem acolhida pela minha patroa, Maria Elisa. Foi um anjo que Deus colocou na minha vida. Tenho contato com ela até hoje. Ela me ensinou tudo, tudo mesmo: me ensinou a andar em São Paulo, me matriculou em escola, abriu conta pra mim em banco. Hoje ela está com 70 e poucos anos e eu falo que ela foi minha segunda mãe.
Você conseguiu trabalho logo que chegou? Em quê?
Empregada doméstica. Trabalhei na casa de uma família em Higienópolis por 15 anos, e nessa época tinha muito preconceito com quem trabalhava em casa de família. Quando comecei a fazer amizades com pessoas através da escola, as pessoas me criticavam muito. Cheguei até a sair dessa casa uma vez, mas acabei voltando. A questão da moradia no trabalho facilitou, pois não tinha que pagar aluguel, podia estudar. Quando saí da casa dela mesmo, foi para casar com o Antônio.
Teve chance de estudar aqui ou pretende estudar ainda?
Estudei até o primeiro ano do ensino médio, mas também fiz cursos através da Maria Elisa: corte e costura, culinária. Não pretendo mais estudar.
Como tem sido viver aqui?
Eu tiro o chapéu para São Paulo. Não me imagino morando em outro lugar. Eu amo São Paulo. Foi a cidade que me acolheu. Eu acho que São Paulo dá pra você ganhar dinheiro de qualquer jeito. Aqui há meios de ganhar dinheiro, coisa que no Nordeste não tem.
A vida que você leva hoje era o que você imaginava?
Não. Eu não imaginava que eu iria abrir meu guarda-roupa e estivesse cheio de roupas. Não imaginava que eu pudesse escolher uma roupa para vestir, porque antigamente eu não tinha o que vestir. Hoje eu tenho, e sou muito grata.
Você costuma visitar sua cidade? Com que frequência? Como você se sente quando volta para lá?
Sim. A primeira vez eu fiquei 10 anos sem ir, mas agora eu gosto muito e vou a cada 2 ou 3 anos. Sinto que é uma cidade que não muda muito, não cresce muito, pois não tem emprego, não tem meio de transporte… o que aumentou foi casa, porque a situação do Nordeste continua difícil, mas um pouco melhor do que na minha época.
Você pensa em voltar a morar em sua cidade natal um dia?
Não. Em São Paulo eu refiz minha vida. Trabalhei honestamente, me aposentei por tempo de trabalho, tenho o meu apartamento, construí uma família aqui, sou casada e tenho dois filhos. Então não tenho por que pensar em voltar para o Nordeste. O que eu tenho hoje, eu devo a São Paulo e ao meu esforço também.
Você se sente parte da cidade onde vive agora?
Sim.
Quando se apresenta, o que você diz primeiro: de onde você veio ou onde mora atualmente?
Onde moro hoje.
O que você trouxe da sua terra que continua com você?
Eu gosto muito da comida nordestina, das músicas, sertanejo, forró, Luiz Gonzaga.
O que você acha que as pessoas deveriam saber sobre quem sai do Nordeste e vem morar aqui?
Eu acho que São Paulo hoje está bem mais fácil do que há 50 anos atrás. Mas o jovem que vem tem que pensar bem, para não se envolver em crime, essas coisas. Hoje, se a pessoa tiver estudo, talvez seja mais fácil ganhar dinheiro, pois há mais oportunidades. Só não faz uma faculdade quem não quer. Na minha época, só fazia faculdade quem era só filhinho de papai, quem tinha uma estrutura de vida. Eu diria para as pessoas estudarem para arrumar um bom emprego.